Em 2002, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) utilizou as eleições daquele ano para testar o voto impresso por meio de um aparelho acoplado às urnas eletrônicas. A mudança havia sido aprovada pelo Congresso Nacional por meio da Lei 10.408/2002, e já valeria para o pleito municipal de 2004.
Antes, no entanto, o órgão decidiu ver como o sistema funcionaria na prática, e, por vários inconvenientes, ele foi reprovado.
Na ocasião, 150 municípios do país, com 6% dos eleitores, receberam cerca de 23 mil impressoras. Em um modelo similar ao proposto agora na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) em discussão na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, o eleitor ia à urna eletrônica, escolhia seus candidatos e seu voto era transmitido para o papel. Ele lia o que estava ali e se estivesse tudo certo, autorizava o depósito da cédula.
Em seu relatório, o TSE explicou que “foram utilizados módulos impressores externos em todo o Distrito Federal, no estado de Sergipe e em algumas cidades próximas da capital de cada estado”.
O documento oficial sobre a experiência de 2002 sepultou o voto impresso naquele momento. Segundo o órgão, “a experiência demonstrou vários inconvenientes na utilização do denominado módulo impressor externo” e “sua introdução no processo de votação nada agregou em termos de segurança ou transparência”.
O tribunal relatou que, por causa da alteração no processo do voto, as filas ficaram maiores nos 150 municípios que serviram de cobaia, aumentou o número de votos nulos e brancos e, por causa de problemas técnicos (algumas impressoras não funcionaram), foi maior o percentual de urnas com votação por cédula, “com todo o risco decorrente desse procedimento”, destacou o TSE.
O órgão detalhou mais ainda os inconvenientes percebidos naquele teste.
“No Rio de Janeiro, por exemplo, observou-se que cerca de 60% dos eleitores não examinaram o espelho do voto na impressora, o que sugere sua desnecessidade.”
“Na Bahia, por problemas de imperícia, o eleitor não conseguia finalizar sua votação, sendo-lhe então facultado votar em cédula de papel, na urna de lona.”
Depois de ver os relatos de cada seção, o Colégio de Presidentes e o Colégio de Corregedores da Justiça Eleitoral concluíram “ser imperativa a eliminação do voto impresso no processo de votação”.
Laudo da Unicamp
Ao mesmo tempo em que testou a mudança, o TSE pediu à Unicamp (Universidade de Campinas) uma avaliação técnica das urnas eletrônicas, para atestar se havia mesmo necessidade para se temer fraudes eleitorais no sistema que era utilizado no país desde 1996.
O relatório do TSE que despachou o voto impresso também trouxe a conclusão da análise dos cientistas da universidade.
“O laudo daquela universidade, de domínio público, concluiu ser ‘robusto, seguro e confiável’ o sistema eletrônico de votação.”
Segundo o documento, o laudo mostra que a urna eletrônica atendia “a todos os requisitos e às exigências fundamentais do processo eleitoral brasileiro, ou seja, ‘o respeito à expressão do voto e a garantia do seu sigilo’, ou seja, a certeza de que o voto dado é o voto apurado”.
Para advogado, mudança é desnecessária e cara
Para o advogado Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em Direito Penal, Constitucional e Eleitoral, não há razão para a alteração do sistema de votação do país. “Utilizamos as urnas eletrônicas desde 1996 e são poucas, para não falar nenhuma, imputação de fraude no processo como um todo.”
A opinião do advogado vai ao encontro do que tem dito repetidas vezes o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, que considera a suposta necessidade de mudança por fraudes eleitorais um absurdo defendido sempre por pessoas que não provam suas acusações. Para ele, o retorno do voto em papel é um retrocesso.
De acordo com o magistrado, as infrações e crimes eleitorais que ocorrem atualmente se dão exclusivamente pela atuação de pessoas e ocorreriam independentemente do modelo adotado na eleição.
“A meu ver, é certamente o procedimento mais seguro. Se lembrarmos lá atrás, a compra de votos se dava por meio da cédula de papel. O eleitor ia votar com uma cédula preenchida e votava com uma em branco”, comenta o advogado.
Acácio Miranda cita que a urna eletrônica brasileira tem servido de referência para outros países, que usam nossa metodologia ou pegam nossos equipamentos emprestados.
O especialista em Direito Eleitoral questiona ainda o modelo híbrido definido pela PEC que tramita na Câmara dos Deputados. “A sistemática é confusa: se o eleitor concordar com esse voto impresso ele seria automaticamente inserido em uma urna para depois ser contado, como se daria essa dinâmica?”
Acácio diz que a alteração no procedimento é mal explicada e trará custos desncessários na ordem de R$ 1 bilhão ao país.
“Sem contar a questão da insegurança neste momento. Quem garante que esse sistema de mostrar ao eleitor sua escolha mantém o sigilo do voto?”