RIO – Wilson Witzel caiu e ninguém lamentou. Não houve político que bradasse em defesa do ex-juiz eleito, tampouco protestos de apoiadores gritando “golpe!” na entrada do Tribunal de Justiça ou da Assembleia Legislativa. Eleito para o governo do Rio com 60% dos votos no segundo turno em 2018, o mandatário do PSC era desconhecido da população até um mês antes do pleito. Empossado, não demorou a comprar briga com o presidente Jair Bolsonaro, a quem se associou no período eleitoral para surfar a onda bolsonarista e crescer na disputa.
O processo de impeachment que resultou na cassação de Witzel nesta sexta-feira, 30, expôs a fragilidade política do governador. Sempre que os deputados precisaram decidir sobre o avanço do processo, o resultado foi por unanimidade. Nunca houve um voto favorável ao agora cassado. Ele perdeu por 69 a 0 nas duas vezes em que a votação se deu no plenário, e por 24 a 0 na comissão especial que analisou o pedido. No Tribunal Misto, nova goleada: 10 a 0.
Também chamou atenção, ao longo do processo, a falta de apoio a Witzel na opinião pública e na população de maneira geral. Apesar de dizer que estava convicto de que a maioria dos fluminenses não queria seu impeachment, o governador não viu um apoiador sequer protestar na porta da Alerj ou do TJ ao longo dos últimos dez meses.
Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o cientista político Paulo Baía avalia que o ex-juiz chegou à unanimidade contra ele pelo modo precipitado de conduzir a política. Hoje, Witzel vê os que estiveram a seu lado em 2018 e no início do governo se afastarem.
“Todos o deixaram sozinho. E o principal sintoma disso foi a primeira votação do impeachment. De lá para cá, não tem uma voz que seja a favor dele, a não ser a dele mesmo”, diz.
Com trajetória política surpreendente – era desconhecido do eleitorado e cresceu, na esteira do bolsonarismo, nas semanas finais da eleição -, o governador cassado conseguiu desagradar tanto à ala mais pragmática da Assembleia quanto sua principal base eleitoral. “Antes de ele brigar com o Bolsonaro, já havia o ressentimento da oposição em relação a Witzel. Junto a isso, conseguiu desagradar uma Assembleia que era a favor dele. Com a briga com o Bolsonaro, conseguiu a façanha da unanimidade”, aponta Baía.
Mesmo sem ter a quem se agarrar neste momento, Witzel seguiu com planos políticos. Em entrevista ao Estadão publicada na última quinta-feira, 29, disse que ainda não descartava ser candidato a presidente. Há cerca de três meses, o governador cassado chegou a procurar interlocutores do PSDB para dizer que gostaria de se filiar ao partido. Jurou que não seria um empecilho à eventual candidatura de João Doria à Presidência.
Apesar dos planos, a classe política avalia que não há futuro eleitoral para Witzel – trata como delirante a ideia dele de voltar ao jogo. Além disso, na sessão em que aprovou o impeachment, o Tribunal Misto o tornou inelegível por cinco anos.
“Witzel teve uma trajetória inusitada e um final político já determinado. Não vai mais a lugar nenhum. Ele pode falar que quer ser presidente da República, pode falar o que quiser. Mas não vai a lugar nenhum”, afirma Paulo Baía.
O ex-governador nega até hoje que tenha sido eleito por causa da onda bolsonarista. Garante que a população acreditou no seu discurso, no passado como juiz federal e na história de vida que apresentou na eleição. A roupagem de ex-juiz, inclusive, era um dos fatores que mais incomodavam os deputados do Rio. Para eles, Witzel nunca tirou a toga e o ar de superioridade o acompanhava.
Além da falta de traquejo político, que chegou a ser contornada durante parte do governo por causa da experiência de alguns representantes do Guanabara – especialmente o ex-deputado federal André Moura (PSC-SE), que comandou a Casa Civil -, alguns episódios minaram a paciência dos parlamentares. Num deles, o ex-secretário de Desenvolvimento Econômico e homem-forte de Witzel, Lucas Tristão, foi acusado de plantar grampos na Assembleia para monitorar os políticos.
Quando o impeachment foi aberto, a postura de Witzel também desagradou o Legislativo. Na leitura dos deputados, ele agiu de forma afobada, oferecendo cargos no governo de modo exacerbado tentar montar às pressas uma base para blindá-lo. O presidente da Assembleia, André Ceciliano (PT), chegou a dizer até que, no Palácio Guanabara, dizia-se que deputado era igual jujuba, dada a facilidade de se comprar aquele doce.
Na entrevista ao Estadão publicada na última quinta-feira, Witzel foi no caminho contrário: alegou que só caiu porque se colocou contra o “toma lá dá cá” que Ceciliano e outros queriam continuar praticando. Depois da sessão que culminou na cassação definitiva, voltou a afirmar que caiu por “combater a corrupção”.